27 maio 2011

A cor e o verbo...

Roubada daqui





É infinito, esse desmedido aroma da palavra encarnado
É vento em fúria e lamento, da razão perdida, ou sustento...
É a palavra nua na noite escura, decassílabo, justa equação, métrica e rima
É assim e acolá, apertado cansaço, gotas de seda, falido embaraço

Bruto, é o querer desalinhado, combustão, calafrio, ou...
dulcíssima prisão...
Transcendente é o verbo que se solta...
talvez embriagado, prende os membros serenos...
... liberdade e guilhotina em resquícios amenos
Virtuosos os sentidos, que exaltam das fendas e se captam nos dedos...
que os amarram [!] no capricho dos verbos, que os corpos reclamam...
Na véspera mornos, agora inflamam!
Ávidas as bocas, que se apartam num lacónico instante...
cobiça constante...
doce inquietação... fulgor inebriante...
Outrora capazes, agora urge o insano deleite...

20 maio 2011

Estrela da Tarde




Era a tarde mais longa de todas as tardes que me acontecia
Eu esperava por ti, tu não vinhas, tardavas e eu entardecia
Era tarde, tão tarde, que a boca, tardando-lhe o beijo, mordia
Quando à boca da noite, surgiste na tarde, tal rosa tardia
Quando nós nos olhámos, tardámos no beijo, que a boca pedia
E na tarde ficámos unidos, ardendo, na luz que morria
Em nós dois, nessa tarde em que tanto tardaste, o sol amanhecia
Era tarde demais, para haver outra noite, para haver outro dia

Meu amor, meu amor
Minha estrela da tarde
Que o luar te amanheça e o meu corpo te guarde
Meu amor, meu amor
Eu não tenho a certeza
Se tu és a alegria ou se és a tristeza
Meu amor, meu amor
Eu não tenho a certeza

Foi a noite mais bela, de todas as noites, que me adormeceram
Dos nocturnos silêncios, que à noite de aromas e, beijos se encheram
Foi a noite, em que os nossos dois corpos cansados, não adormeceram
E, da estrada mais linda da noite, uma festa de fogo fizeram

Foram noites e noites, que numa só noite, nos aconteceram
Era o dia da noite, de todas as noites, que nos precederam
Era a noite mais clara, daquelas que à noite se amando, se deram
E entre os braços da noite, de tanto se amarem, vivendo morreram

Meu amor, meu amor
Minha estrela da tarde
Que o luar te amanheça e o meu corpo te guarde
Meu amor, meu amor
Eu não tenho a certeza
Se tu és a alegria ou se és a tristeza
Meu amor, meu amor
Eu não tenho a certeza

Eu não sei, meu amor, se o que digo é ternura, se é riso, se é pranto
É por ti que adormeço e acordo e, acordado, recordo no canto
Essa tarde, em que tarde surgiste, dum triste e profundo recanto
Essa noite, em que cedo nasceste, despida de mágoa e de espanto
Meu amor, nunca é tarde nem cedo, para quem se quer tanto!

Poema de Ary dos Santos

14 maio 2011

Simbiose




Ela... 
ela tem aroma a menina-mulher...


ela tem a candura...
ela tem o intenso e soberano...
ela tem o diabolicamente angelical...
ela tem o encanto...
ela tem asas púrpuras...
ela tem um ar... de Mulher Libertya...




As mãos dela e as minhas bailaram assim...
... em exquisite corpse





Sei-te em mim aos pedaços...
Puxo o elástico do espírito,
sem te usurpar a alma em flor
e, vejo-te em gotas de chuva
... que me caem no rosto...
Sei-te, porque me sei a mim...



Sinto-te em cada respirar...
Em golfadas de ar, como vida que me alimenta,
como se em suspenso me mantivesse...
Sinto-te em cada aroma e sabor, adociçados e frescos,
hortelã pimenta que me inebria... enfeitiça...
como se lenha fosses, na minha fogueira...
Sinto-te, como me sinto a mim...


Sei-te devagarinho,
de mansinho vou(te) sabendo...
olho-te no vice-versa ou, no reverso do meu jeito
sei que os teus braços são leves...
são plumas que me enfeitam o peito
Sei-te num pensamento longe,
aroma de jasmim... brilho de lua, banho de mar
Sei-te, porque me sei a mim...


Sinto-te em cada caminhar,
Como pegada que me marca o ser
Plena na sua forma, única do teu saber…
Sinto-te de forma avassaladora,
Nas veias que me inundam, de sangue galopante,
Mar revolto num usurpar de sentidos...
Brisa suave, Magnólia em flor, repasto dos Deuses,
Sinto-te, porque sei-te assim...


E o sabor que tem o teu saber...
É Alma estendida ao sol
Coração em desalinho
É descanso, fogo e Universo
Pele rubra de carmim...
Sei-te, porque me sei a mim...


As mãos dela são escarlate, as minhas, cinza...